sexta-feira, novembro 03, 2006

Admito, tenho medo

Hoje acordei pensando no futuro, e sinceramente, tive medo.
Pois hoje me olho no espelho, e não mais me reconheço, não vejo mais o homem de anos atrás, tão cheio de certezas e pilares de verdade, que queria ganhar o mundo com suas palavras.
Creio que em certa medida, me decepcionei. Me decepcionei com os jogos, com a cobiça, com a ansiedade desenfreada, e as palavras impensadas que já proferi, e vi proferirem.
Me decepcionei com o ser humano, principalmente o que há em mim, pois acreditei que poderia ser suficiente, e abracei tarefas que se mostrarão fúteis e sem sentido, perdi muito tempo no que não importava, só para agradar à uma platéia que hoje, reconheço, vive de ilusões, pois a verdade lhes é extremamente amarga, pois suas próprias bocas foram contaminadas com o moralismo, e o fundamentalismo nascidos da alma humana, numa patética tentativa de se elevar frente ao Absoluto.
Gastei muito tempo longe dos meus, atrás de um sucesso que o mundo inteiro ansiava de mim, mas que para mim foi de pouca valia.
Tantas noites em claro, tantas preocupações, tantas tarefas a serem cumpridas, e no fim, percebi que a maioria delas era apenas Vaidade de Vaidades, como dizia Salomão.
Tantas pessoas, tantos nomes, tantas oportunidades, deixadas de lado, pela falta de tempo que eu mesmo criei.
E hoje, estou num turbilhão de confusões e angustias de minha alma, pelo que deixei passar, pelo que não deixei passar, pelos que conheci, e pelos que tento esquecer.
Não nego, tenho medo.
Pois sempre trabalhei com panoramas traçados, esquemas prontos, tudo estritamente planejado. Mas o caminho não é assim.
E olho para frente e o que vejo é uma multidão de possibilidades, mas nenhuma bem definida.
Como um pássaro a borda do ninho, eu ouço uma voz que diz "Pule!!", mas sinceramente, tenho medo.
Tenho medo, de viver pelo vento, indo aonde ele sopra, sem noção do futuro mais próximo, sem planos, apenas indo.
Não, não estou decepcionado com Deus, pois talvez somente agora, nesses momento de duvida e angustia é que eu realmente ouço sua voz me dizendo, "Pule!!!".
Olho para trás e vejo a mim mesmo, e outros, se agarrando ao ninho, gritanto para que eu não faça isso, que existe outro jeito, que é arriscado, que podemos preparar uma estratégia.
E olho para baixo, a altura é imensa, mas a imensidão do horizonte incerto diante de mim, é bem maior.
Sinto a brisa que vem de longe, um vento suave, mas marcante. Minhas angustias e medos me seguram no chão, presos à uma falsa segurança, um castelo de cartas que o vento pode desfazer quando quiser.
Sei que tenho asas, que posso voar, embora o medo as mantenha junto de mim.
E penso, quantos, quantos já não saltaram, e sem dar ouvidos aos seus medos abriram asas e entraram na dimensão desse horizonte infinito, e incerto, e construíram seus caminhos seguindo apenas a voz que me diz "Pule!!!"?
E quantos que saltaram, mas não abriram as suas asas, e até hoje caem para a morte certa?
Paro em frente ao meu ninho, um precípicio está aos meus pés, mas o horizonte está adiante.
Uma última vez, ouço a voz dizer "Pule!!!" antes de me precipitar, para o infinito, onde minhas "certezas" são dissipadas pelo vento que toca meu rosto.

O Poeta

O poeta ao contrario do que muitos dizem, não é aquele que consegue casar rimas em frases de efeito, ou que simplismente identifica uma musicalidade a esmo, nas coisas visíveis e invisíveis.
Não, o poeta é algo mais, que pode viajar profundamente pelos dramas e sonhos humanos e transforma-los numa linguagem propositiva, expressando através de um idioma, de uma cultura, de figuras de linguagem, tudo aquilo que sua alma sente.
Sendo assim, o poeta é antes de tudo um tradutor, que consegue fazer o que parece a princípio ser impossível, transcrever para palavras o que é impronunciavél, tranformar em objetividade escrita, mesmo que essa objetividade seja paradoxalmente composta de subjetividade, tudo aquilo que não pode ser dito, mas sentido.
Logo, o que o poeta propõe, é a descrição do indescritível, a exposição do oculto, a abertura dos porões da alma.
Então fica claro que o poeta também é um aventureiro, pois se arriscou a conhecer mais profundamente a própria alma, e através desse conhecimento, aceitou a tarefa às vezes frustrante, às vezes recompensadora de entender a alma humana.
Sim, pois aí está marcada toda a veracidade e legitimidade do que escreve, pois um poeta só fala daquilo que sente, simples assim.
Mas nem sempre feliz, pois quando alguém se propõe a conhecer a si mesmo com uma dose de profundidade como essa, pode estar mais aberto as coisas pequenas e passageiras, mas que fazem a diferença na vida de muitos, embora nem todos saibam disso, pode estar aberto a encontrar expressões de felicidade onde ninguém mais as vê, no entanto pode também, encontrar o medo e a angústia, o sofrimento e a solidão em frases, gestos ou simplismente no silêncio de quem ama.
Sendo assim, acredito que todo poeta, é também um pouco profeta. Não no sentido premonitivo da palavra, uma vez que os poetas não fazem previsões, ou entregam profecias, mas no sentido de poder enxergar pequenas porções do divino, aqui e ali, e se alegrar com elas, bem como trazer para si a profunda tristeza que a ausência delas traz.
Portanto, o poeta é uma pessoa extrememente passional, embora utilize a métrica de rimas e estrofes.
Ele consegue trazer a harmonia inerente em cada alma humana, para compor pedaços de expressão sobrenatural divina, para os homens que infelizmente perderam essa capacidade. É um porta voz do oculto, daquilo que não se vê, traduzindo em algumas palavras a multidão de sonhos e impressões guardada na alma humana.
Nos mostrando o quanto nos podemos deixar que o paraíso se aproxime, ou o quanto nos podemos construir do inferno... tudo isso, dentro de nós.