quarta-feira, julho 18, 2007

As razões para o amor

Rubem Alves
Os místicos e os apaixonados concordam em que o amor não tem razões. Angelus Silésius, místico medieval, disse que ele é como a rosa : “A rosa não tem “porquês”. Ela floresce porque floresce.” Drummond repetiu a mesma coisa no seu poema As Sem-Razões do Amor. É possível que ele tenha se inspirado nestes versos mesmo sem nunca os ter lido, pois as coisas do amor circulam com o vento. “Eu te amo porque te amo…” - sem razões… “Não precisas ser amante, e nem sempre sabes sê-lo.” Meu amor independe do que me fazes. Não cresce do que me dás. Se fosse assim ele flutuaria ao sabor dos teus gestos. Teria razões e explicações. Se um dia teus gestos de amante me faltassem, ele morreria como a flor arrancada da terra. “Amor é estado de graça e com amor não se paga.” Nada mais falso do que o ditado popular que afirma que “amor com amor se paga”. O amor não é regido pela lógica das trocas comerciais. Nada te devo. Nada me deves. Como a rosa que floresce porque floresce, eu te amo porque te amo. “Amor é dado de graça, é semeado no vento, na cachoeira, no eclipse.
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Amor foge a dicionários e a regulamentos vários… Amor não se troca… Porque amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo…” Drummond tinha de estar apaixonado ao escrever estes versos. Só os apaixonados acreditam que o amor seja assim, tão sem razões.
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Mas eu, talvez por não estar apaixonado (o que é uma pena…), suspeito que o coração tenha regulamentos e dicionários, e Pascal me apoiaria, pois foi ele quem disse que “o coração tem razões que a própria razão desconhece”. Não é que faltem razões ao coração, mas que suas razões estão escritas numa língua que desconhecemos. Destas razões escritas em língua estranha o próprio Drummond tinha conhecimento, e se perguntava: “Como decifrar pictogramas de há 10 mil anos se nem sei decifrar minha escrita interior? A verdade essencial é o desconhecido que me habita e a cada amanhecer me dá um soco.” O amor será isto: um soco que o desconhecido me dá? Ao apaixonado a decifração desta língua está proibida, pois se ele a entender, o amor se irá. Como na história de Barba Azul: se a porta proibida for aberta, a felicidade estará perdida. Foi assim que o paraíso se perdeu: quando o amor - frágil bolha de sabão - não contente com sua felicidade inconsciente, se deixou morder pelo desejo de saber.
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O amor não sabia que sua felicidade só pode existir na ignorância das suas razões. Kierkegaard comentava o absurdo de se pedir aos amantes explicações para o seu amor. A esta pergunta eles só possuem uma resposta: o silêncio. Mas que se lhes peça simplesmente falar sobre o seu amor - sem explicar. E eles falarão por dias, sem parar… Mas - eu já disse - não estou apaixonado. Olho para o amor com olhos de suspeita, curiosos. Quero decifrar sua língua desconhecida. Procuro, ao contrário do Drummond, as cem razões do amor… Vou a Santo Agostinho, em busca de sua sabedoria. Releio as Confissões, texto de um velho que meditava sobre o amor sem estar apaixonado. Possivelmente aí se encontre a análise mais penetrante das razões do amor jamais escrita. E me defronto com a pergunta que nenhum apaixonado poderia jamais fazer: “Que é que eu amo quando amo o meu Deus?” Imaginem que um apaixonado fizesse essa pergunta à sua amada: “Que é que eu amo quando te amo?” Seria, talvez, o fim de uma estória de amor. Pois esta pergunta revela um segredo que nenhum amante pode suportar: que ao amar a amada o amante está amando uma outra coisa que não é ela. Nas palavras de Hermann Hesse, “o que amamos é sempre um símbolo”. Daí, conclui ele, a impossibilidade de fixar o seu amor em qualquer coisa sobre a terra. Variações sobre a impossível pergunta: “Te amo, sim, mas não é bem a ti que eu amo. Amo uma outra coisa misteriosa, que não conheço, mas que me parece ver aflorar no seu rosto. Eu te amo porque no teu corpo um outro objeto se revela. Teu corpo é lagoa encantada onde reflexos nadam como peixes fugidios… Como Narciso, fico diante dele… No fundo de tua luz marinha nadam meus olhos, à procura… Por isto te amo, pelos peixes encantados…”(Cecília Meireles)
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Mas eles são escorregadios, os peixes. Fogem. Escapam. Escondem-se. Zombam de mim. Deslizam entre meus dedos. Eu te abraço para abraçar o que me foge. Ao te possuir alegro-me na ilusão de os possuir. Tu és o lugar onde me encontro com esta outra coisa que, por pura graça, sem razões, desceu sobre ti, como o Vento desceu sobre a Virgem Bendita. Mas, por ser graça, sem razões, da mesma forma como desceu poderá de novo partir. Se isto acontecer deixarei de te amar. E minha busca recomeçará de novo…” Esta é a dor que nenhum apaixonado suporta. A paixão se recusa a saber que o rosto da pessoa amada (presente) apenas sugere o obscuro objeto do desejo (ausente). A pessoa amada é metáfora de uma outra coisa. “O amor começa por uma metáfora”, diz Milan Kundera. “Ou melhor: o amor começa no momento em que uma mulher se inscreve com uma palavra em nossa memória poética.” Temos agora a chave para compreender as razões do amor: o amor nasce, vive e morre pelo poder - delicado - da imagem poética que o amante pensou ver no rosto da amada…

segunda-feira, maio 07, 2007

AMARGURA: um “espírito” de falsificação da realidade!

Nada falsifica mais a realidade e a comunicação do que a amargura.

Quando ela se instala, pela via das machucaduras, das traições, das frustrações, das repetições desagradáveis, ou das muitas acusações recíprocas — nada mais continua a existir objetivamente na visão e na comunicação entre duas pessoas.

É assim até mesmo entre pessoas que se amam, mas que se feriram de alguma maneira.

Na maioria das vezes alguém feriu alguém, e o ferido se magoa profundamente — dependendo do fato, se magoa até a morte —; e se decide continuar a relação porque vê amor naquele que o magoou (embora lhe tenha sido infiel ou desleal, ou estranho), geralmente não consegue ir adiante sem expor sua dor; a qual, quase sempre, no início vem carregada de acusação, mesmo quando não acusa intencionalmente. Entretanto, como o objeto em questão, é o próprio ouvinte-arrependido, ele acaba por se sentir sempre acusado outra vez.

Com o passar do tempo, aquele que feriu a quem ama, também já está ferido e magoado de um outro modo. Ainda que ele (a) saiba que não tem direito de estar. Mas fica assim mesmo.

No caso dele tudo começa com a tristeza imensa de ter magoado a quem ama.

Depois, a pessoa começa a desejar se sentir diferente de "si mesma" no que tange ao "si mesmo" que provocou a mágoa no outro.

Entretanto, como a dor do ofendido e magoado continua naturalmente presente; muitas vezes apesar de já haver perdão (a dor é outra coisa) —; com passar do tempo aquilo que aos ouvidos do ofensor era culpa, começa a soar como acusação sem fim, mesmo quando é apenas a confissão da tristeza pelo que aconteceu.

Nesse ponto o ofensor passar a se irritar e a acusar o outro de não parar de acusá-lo e de vê-lo de modo ruim...

Então, instala-se no coração do ofensor uma predisposição a ouvir tudo com tom de acusação.

Ora, quando se chega a esse ponto da "viagem", o sentido de objetividade já entrou em estado de falência; e todos os poderes da subjetividade se tornam os senhores do olhar, do sentir; e, pior, do interpretar.

Daqui para frente somente uma intervenção da Graça de Deus os ajudará a sair desse Labirinto de Dês-comunicação!

Sim, uma intervenção que gere consciência nos implicados e também lhes revele a existência desse Monstro Invisível.

E mais: que lhes ilumine e revele que de fato tal "ente" que "penetrou" o processo mental e de comunicação deles, é inexistente; posto que somente "existe" como emoção machucada, a qual falsifica tudo; fazendo com que carinhos sejam sentidos como ofensa; fazendo com que tentativas de comunicar, se tornem discussões inexplicáveis; e também fazendo com que toda expressão que não seja clara e objetivamente comunicada como boa, seja sentida pelo outro como uma incógnita ruim; sempre ruim; e sempre contra aquele que ouve e interpreta — ainda que de fato o outro não tenha intentado nada de mal contra aquele que assim ouviu e sentiu.

É aqui que duas pessoas que se amam e não mais conseguem se entender, perguntam-se: o que está acontecendo com a gente?

Na realidade, nada está acontecendo, embora tudo pareça acontecer!

Afinal, objetivamente, o que tinha de acontecer, já aconteceu. E, supostamente, já está resolvido.

Porém, o processo de retro-alimentação relacional (em razão das dores e das machucaduras da alma do ofendido, e em razão da culpa e da vergonha do ofensor), torna-se cada vez mais destrutivo para as emoções dos implicados; e, consequentemente, passa a ser o produtor de boicote na comunicação.

O que fazer?

A primeira coisa é entender o processo, conforme simplificadamente exposto acima.

A segunda é colocá-lo em seu lugar: na memória doída, mas que não tem que existir como acusação nem na boca de quem sente a dor, e nem nos ouvidos de quem a provocou.

A terceira é voltarem a crer um no outro, sem interpretações e sem analises.

A quarta é darem objetividade e clareza a cada palavra ou declaração, não somente em relação um ao outro, mas também em relação a tudo; até que a objetividade volte a prevalecer sobre a subjetividade das interpretações adoecidas pela mágoa.

A quinta é não conversar num mundo paralelo, jamais; mesmo que seja em quase silencio ou em silencio; pois para o outro isso pode significar outra coisa; qualquer coisa.

A sexta é coragem de olhar nos olhos do outro, todos os dias, e relembrá-lo de quem ambos são um para o outro. Sim, afirmarem-se mutuamente como pessoas que se amam, apesar de machucadas.

A sétima é não deixar nada aberto, sem definição. Ou seja: não deixar o sol se por sobre nenhuma ira ou mágoa não falada. Mas isto apenas no caso de coisas que não possam ser resolvidas sem uma "conferência" entre ambos.

A oitava é crer que quem se ama, pode se machucar, mas que o amor tem que ser maior que qualquer dor, quando dois decidiram continuar juntos.

A nona é saber que a tendência de um processo desse tipo, é fabricar algo que não é nada, mas que se faz cheio de tudo o que não existe ou não lhe pertence; e, que, portanto, pode se munir de tudo contra ambos; ou um contra o outro. Aqui o diabo e o inferno são os limites; posto que agora, em tal caso, reina a acusação.

A décima é se perdoarem todos os dias; e também perdoarem-se por qualquer que seja a recaída no processo de retro-alimentação da amargura, e que tenha voltado a crescer em razão das "interpretações" que se tornam falsas realidades; mas que têm o poder de matar o que é real e verdadeiro. Por isto, não se pode deixar isto crescer jamais.

O escritor de Hebreus disse que uma raiz de amargura, entrando em alguém, pode contaminar a muitos, a todo um grupo.

Ora, se a amargura tem esse poder em relação a uma "congregação", quão maior não é o seu poder de contaminação entre duas pessoas? Ou entre um casal? Ou nas entranhas de uma família?

Assim, eu oro:

Senhor! Dá-nos Tua luz, para que nela sempre vejamos o que é real, sendo assim salvos das miragens do Engano e do Enganador!

Senhor! Ajuda-nos a viver o que é real!

Senhor! Que o amor sempre vença todas as falsificações!




Nele, que é a Verdade,




Caio

terça-feira, abril 24, 2007

A verdade em metades

A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passarmeia pessoa de cada vez.Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.E sua segunda metade voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metadesdiferentes uma da outra.Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar.
Cada um optou conformeseu capricho, sua ilusão, sua miopia.O poema de Carlos Drummond de Andrade é um convite à humildade e à comunhão. Comunhão não existe sem humildade. E sem as duas, não existe experiência da verdade. A verdade a gente não sabe. A verdade a gente vive quando ela se apropria de nós. A verdade não é coisa da razão, resultado da reflexão. A verdade é soma de corações e não de cabeças. A verdade é coisa fugidia, que não se deixa prender na gaiola dos raciocínios, não cai nas armadilhas dos pensamentos. A verdade é isso, a gente experimenta, saboreia, se delicia, mas não fica com ela como quem tem posse, pois a verdade é maior do que nós, em cada um de nós só cabe meia verdade. E a gente tenta fazer uma verdade inteira juntando as partes e ficando com elas, como quem rouba do outro a metade que está com ele, pra depois a gente ficar dono da verdade. Mas a verdade não participa desse jogo. O jogo da verdade não é soma, é partilha. Não é brincadeira onde quem tem mais meia verdade ganha. É mais como uma dança aonde a beleza e o alumbramento vêm no par, ou até mesmo na roda, aonde as mãos e braços vão se encontrando e se despedindo, até que todo mundo na roda vive a verdade, e brinca com ela cada vez que os braços se entrelaçam e as mãos se acariciam. No fim da noite, quando cada um vai para casa descansar, a verdade também se recolhe, para que no dia seguinte todo mundo se precise novamente. Assim a humildade e a comunhão cuidam da verdade.Na dança da verdade, meia verdade é verdade com limite, é verdade incompleta, dizendo para todo mundo que as idéias são menos importantes que as pessoas. Quem não consegue entrar na roda é quer espreitar para colecionar fragmentos de verdade, imaginando ser possível ficar dono da verdade e viver tomando conta da verdade, de fato, não vive com a verdade, mas com o capricho, a ilusão ou a miopia. Porque prefere as idéias às gentes, fica com a mentira, porque a verdade é uma pessoa e não um conceito. A verdade é uma pessoa, que gosta de brincar, de rir e de chorar. A verdade é uma pessoa que se dá a conhecer na comunhão dos humildes: “onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estarei no meio deles”, disse a verdade inteira aos que tinham consigo apenas meias verdades.

Cantar me enlouquece

Quando me ordenas cantar, parece que o meu coração vai arrebentar-se...
Pensei que poderia te pedir a grinalda de flores que levas no pescoço...
Essa que ficou sempre na profundidade do meu ser...
A minha libertação...
Daqui por diante eu me expressarei em sussurros...
Cantar me enlouquece...
Quando me ordenas cantar,
parece que o meu coração vai arrebentar-se
de orgulho. Então contemplo a tua face e as
lágrimas me vêm aos olhos.
Tudo o que é duro e dissonante em
minha vida se dissolve em única e doce
harmonia, e a minha adoração abre as
suas asas, como um pássaro alegre voando
sobre o mar.
Sei que tens prazer no meu canto.
Sei que posso chegar à tua presença apenas
como um cantor.
Com a ponta da asa imensamente
aberta do meu canto eu roço os teus pés,
que eu jamais poderia querer alcançar.
Embriagado pela alegria de cantar,
esqueço a mim mesmo e te chamo amigo,
tu que és o meu Senhor.
Pensei que poderia te pedir a
grinalda de flores que levas no pescoço,
mas não me atrevi. Fiquei esperando pela
manhã, quando tivesses ido embora, para
encontrar pedaços dela no leito. E fiquei na
madrugada feito mendiga, procurando
uma ou duas pétalas caídas.
Coitada de mim, o que foi que
encontrei? O que me restou do teu amor?
Nem flor, nem perfume, nem jarro de água
perfumada... Apenas a tua espada
poderosa, flamejante como chama e pesada
como raio na tempestade. A luz jovem da
manhã entra pela janela e se derrama em
teu leito. O pássaro da manhã começa a
cantar, e me pergunta: "Mulher, o que é
que encontraste?" Não, não foi uma flor,
nem perfume e nem jarro de água
perfumada. Encontrei apenas a tua espada
poderosa.
Sento-me e fico cismando, admirado
com essa tua dádiva. Não acho lugar onde
escondê-la. Tenho vergonha de usá-la, tão
frágil sou, e ela me fere quando eu a aperto
contra o peito. Mesmo assim, porém, eu
levarei no meu coração esse honroso fardo
de dor, que é a tua dádiva para mim.
Doravante nada mais temerei neste
mundo, e tu conquistarás a vitória em
todas as minhas lutas. Deste-me a morte
por companheira, e eu vou coroá-la com a
minha vida. A tua espada está comigo para
cortar as minhas amarras, e nada mais
temerei neste mundo.
Doravante eu abandono todos os
adornos fúteis. Senhor do meu coração,
não vou mais ficar esperando ou me
desesperando pelos cantos, e nunca mais
vou ser tímida ou caprichosa. Deste-me
como ornamento a tua espada. Não preciso
mais dos enfeites de boneca.
Essa que ficou sempre na profundidade do meu ser,
no crepúsculo de
vislumbres e percepções momentâneas; essa
que jamais retirou seus véus na luz da
manhã, essa irá ser a minha última
oferenda a ti, meu Deus, envolta na minha canção final.
As palavras a cortejam, mas não conseguiram vencê-la, e a persuasão inutilmente estendeu para ela os seus braços ansiosos.
Vaguei de país em país, conservando-a
no íntimo do meu coração, e ao redor
dela a minha vida ergueu-se e caiu, ao
mesmo tempo forte e frágil.
Embora habite sozinha e afastada, ela sempre reinou sobre todos os meus pensamentos e ações, sobre todos os meus sonos e sonhos.
Muitos bateram à minha porta,
perguntaram por ela, e foram-se embora,
sem esperança.
Ninguém no mundo conseguiu vê-la face a face, e ela continua em sua solidão,
à espera do teu reconhecimento.
A minha libertação, para mim, não está
na renúncia. Sinto o abraço da liberdade
em mil laços de prazer.
Daqui por diante eu me expressarei
em sussurros...
...Gastei muitas e muitas horas na luta
entre o bem e o mal. Mas agora o prazer do
meu companheiro de jogos nos dias vazios
é atrair o meu coração para o seu. E eu
não compreendo por que esse repentino
convite para não sei qual inútil
inconseqüência!
Cantar me enlouquece, e se eu me
desfizesse todo num vôo de canção, nada
me pesaria tanto...

Rabindranath Tagore

O DEUS ESVAZIADO

Baseado na PARÁBOLA DOS FILHOS PERDIDOSLucas 15.11-32Você pode fazer teologia de cima para baixo e de baixo para cima. Caso escolha fazer de cima para baixo, terá a companhia de todos os filósofos, especialmente os gregos, que se fixaram numa idéia de perfeição de Deus, e deram toda ênfase aos atributos incomunicáveis de Deus: onipotência, onisciência e onipresença, por exemplo (Jó 42.2; Salmo 139; Isaías 43.13; Lucas 18.27). Todos os que olham para Deus através desse paradigma imaginam Deus num alto e sublime trono (Isaías 6.1), habitando em luz inacessível (1Timóteo 6.16) e, invocado mediante a oração da fé, vem ao mundo fazer coisas boas (milagres) para seus filhos. Não há nada de errado nesta descrição de Deus.Mas você também pode fazer teologia de baixo para cima. Nesse caso, você deverá deixar de lado aquilo que Deus é em termos de sua perfeita natureza eterna, e focar sua atenção na maneira como Deus escolheu se revelar e se relacionar com as pessoas na história. Seus olhos devem deixar de lado a visão ideal e abstrata da filosofia, e se voltar para Jesus Cristo, suas ações e palavras, que revelam o Pai (João 10.30; 14.9).A Bíblia ensina que Jesus é Deus esvaziado, Deus em forma humana, em forma de servo (Filipenses 2.5-8). Jesus é Deus conosco, isto é, Deus se revela e se relaciona conosco em Jesus (João 1.14,18; Hebreus 1.1-3). Em Jesus, Deus está esvaziado, pois sua onipotência foi limitada pela fé dos que a ele se achegavam (Mateus 13.53-58), seu onisciência foi limitada pelo Pai (Mateus 24.36), e sua onipresença foi limitada pela própria encarnação.A expressão Deus esvaziado não diz respeito à natureza de Deus. Deus é o mesmo, tanto no alto e sublime trono como encarnado na pessoa de Jesus. Mas a maneira como Deus se relaciona no céu é diferente da maneira como se relaciona na terra. No céu Ele faz tudo quanto lhe agrada e reina soberano. Na terra Ele age em e com as pessoas que atendem seu convite para a comunhão em seu Filho: "venha o teu reino, seja feita a tua vontade assim a terra como no céu" (Salmo 115.3,16; Mateus 6.10; 1Coríntios 1.9). Isso fica mais claro quando compreendemos os critérios segundo os quais Deus escolheu se relacionar com seus filhos, conforme Jesus ensina na “parábola dos filhos perdidos” (Lucas 15.11-32).Em primeiro lugar, o Deus esvaziado se relaciona com base no critério da liberdade. O filho mais novo pede a sua parte da herança e vai embora da casa do pai. Naquela época e cultura, o pedido equivaleria a dizer mais ou menos o seguinte: “Pai, tudo o que quero é que o senhor morra. Tudo o que me interessa é seu talão de cheques”. O impressionante é que o pai não faz oposição a esse desejo do filho. O critério é a liberdade: “Você quer ir, meu filho, eu lamento, mas vou não vou amarrar você ao meu lado, não vou obrigar você a conviver comigo contra a sua vontade. Siga seu caminho”.O Deus esvaziado não mantém relacionamentos à força, mediante manifestação do seu poder e imposição de sua autoridade soberana. O Deus esvaziado dá um passo atrás, para que você possa exercer sua liberdade de existir com Ele ou contra Ele.Em segundo lugar, o Deus esvaziado se relaciona com base no critério da interpelação. O filho mais velho se recusa a participar da festa que o pai promove para se alegrar com o retorno do filho mais novo, que estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado. O pai vai ao encontro do filho mais velho e o interpela, o confronta e o coloca diante da necessidade de uma decisão. Mas não decide por ele, nem o obriga a se submeter à sua vontade.O pai não exige obediência dizendo “Enquanto você estiver na minha casa fará as coisas do meu jeito”. O pai confronta o filho e espera tocar sua consciência, para que, semelhantemente ao filho mais novo, ele também “caia em si”, e experimente uma transformação de dentro para fora, de modo que sua submissão à vontade do pai seja um ato voluntário e consciente de ser a melhor escolha.Deus não é um solucionador de problemas. É um solucionador de pessoas. Deus não prometeu fazer nossa vida melhor. Prometeu nos fazer homens e mulheres melhores: semelhantes ao seu Filho (Romanos 8.28-30; 2Coríntios 3.18; Gálatas 4.19; Efésios 4.11-13).Quem espera uma vida melhor como resultado da intervenção do Deus onipotente, onipresente e onisciente, acaba se frustrando e sucumbindo em culpa e incredulidade. Quem espera ser uma pessoa melhor e andar em comunhão com Deus, numa relação de amor e liberdade, respondendo suas interpelações e desfrutando sua presença e doce companhia é capaz de enfrentar a vida, qualquer que seja ela.

segunda-feira, abril 23, 2007

U2 e a Igreja chamada Vertigo

Uma das pessoas que incentivaram o lançamento do livro Walk On - A jornada espiritual do U2 foi o vereador Carlos Alberto Bezerra Jr.
Sua luta por uma igreja mais relevante para a sociedade e inserida culturalmente na comunidade pode ser vista através dos seus dois mandatos como vereador e na organização do Usina 21, evento que mobiliza milhares de jovens cristãos na cidade de São Paulo, em um dia de muita festa e engajamento, num encontro cujo lema é: Jovens, Idéias e Transformação Social.
Em seu mais recente texto, Junior comenta sobre o conteúdo cristão nas letras das músicas do U2. Confira a seguir a íntegra do texto:

U2 e a Igreja chamada Vertigo, por Carlos Bezerra Junior. (fonte: Site oficial do vereador)

"Hello, hello! I'm at a place called vertigo..." Foi ouvindo estes versos que eu me dei conta de onde estava: no estádio do Morumbi, assistindo ao show da banda U2, que tocava a segunda música do dia, em São Paulo. Perto de mim, o prefeito José Serra. A reação à apresentação dos roqueiros irlandeses é geralmente essa mesmo. Ficamos meio que tontos diante do cenário gigante, da performance perfeita, do carisma de Bono. Depois do show, recebi vários e-mails de irmãos questionando o conteúdo cristão das músicas do U2 e das bandeiras sustentadas pelo vocalista. Resolvi escrever o que penso.

Seriam eles cristãos? Sim, eles são. Alguns podem torcer o nariz para essa afirmação. Conheço todos os argumentos contrários de cor, e, sobre isso, penso sobre como o nosso olhar se tornou superficial nos últimos anos, ou, então, como a nossa teologia se tornou rasa. Excluímos do nosso círculo quem não segue os mesmos padrões de comportamento. Enquanto isso, o "Você também" do U2 prefere incluir.

Não sei se a maioria quer enxergar o miolo da questão, se quer tocar a alma desses artistas. Aos que desejam isso, sugiro uma leitura atenta das músicas. O U2 fala, principalmente, da loucura da vida moderna, das nossas cidades, da ausência de sentido das guerras, das conquistas, dos fracassos. Num mundo vertiginoso, eles procuram algo que os faça "sentir" –é o que diz "Vertigo". Mas é também o que diz "I still haven't found what I'm looking for", na qual Bono canta a sua busca por entender o sentido da condição humana.

As cidades sem nome, onde as luzes cegam, os arranjos eletrônicos que causam estranhamento... São esses os cenários desenhados pelo U2 em seu lamento pela tristeza do mundo, que vem desde o domingo sangrento de "Sunday Bloody Sunday". A crítica musical muitas vezes o classifica como piegas. Porém a maneira como os irlandeses se colocam no hit parade, carregados de influências que vão dos Beatles aos punks Ramones, apresentando criações originalíssimas e baladas que marcam gerações, é surpreendente. Em todas as letras, há conceitos cristãos claros, e as bandeiras –como a coexistência pacífica das religiões, e não o ecumenismo— são as mais evangélicas que conheci.

Há canções específicas em que o Evangelho é declarado de forma explícita, porém os que não são cristãos não a compreendem dessa forma. Dos primeiros CDs da banda até o consagrado "War", as referências à fé predominam. Em "Boy", o trabalho de estréia do U2, Bono canta em "I Will Folow" ("Eu Seguirei"): "I was on the outside when you said/ You needed me/ I was looking at myself/ I was blind, I could not see. (Eu estava por fora quando você disse. Preciso de você. Eu estava observando a mim mesmo/ Eu estava cego, não podia ver)". Entre "Boy" e "War", está "October", considerado um dos trabalhos mais cristãos da banda.

Além das declarações de fé do U2, o testemunho público de Bono confirma o que ele canta. O envolvimento do vocalista no Jubileu 2000, movimento que propõe o perdão da dívida externa dos países africanos, o forçou a atrasar em um ano o lançamento do novo CD. Há 25 anos casado com a mesma mulher, Bono fala com presidentes, discursa, prega em seus shows usando o palco como púlpito. Em qualquer oportunidade, ele está chamando atenção para a pobreza e a injustiça social.

Tudo isso pode parecer novidade para nós, brasileiros, mas para irlandeses e americanos, a confissão de fé dos roqueiros do U2 é praticamente domínio público. Este fato está sendo corrigido com o lançamento de "Walk On A Jornada Espiritual do U2", tradução do livro de Steve Stockman (W4 Editora). Neste ensaio, vemos a compilação de milhares de entrevistas de Bono Vox ao longo dos anos e descobrimos que ele mesmo parou de tocar no assunto igreja para evitar maiores transtornos pessoais e na carreira da banda. Mas há muitas outras coisas interessantes a conferir no livro.

O passado do jovem vocalista em Dublin, o tempo de escola bíblica, é um dos capítulos interessantes. Entendemos o que era o movimento evangélico daquele lugar naqueles tempos. Era o auge da guerra entre católicos e protestantes e a igreja não estava encerrada entre as quatros paredes do templo, e sim nas trincheiras. As canções não eram apenas de louvor, mas também de protesto por tamanha incoerência de ambos os lados da batalha. Quem não se lembra da cena de Sinéad O'Connor, a cantora careca de "Nothing Compares 2 U", queimando a fotografia do Papa?

O U2 é um produto da Igreja, mas não para consumo interno. Hoje, vejo em Bono inúmeras expressões do Evangelho, e dos valores que aprendemos aos domingos (ou que deveríamos estar aprendendo), vejo a tentativa frutífera de atingir para além do gueto que criamos, para além dos muros do templo. E isso, convenhamos, assusta a qualquer um. Ao mesmo tempo revela uma coragem que a maioria dos nossos músicos maravilhosos não tem. Aqui eu escrevo sem ironia: nós, cristãos, abastecemos o setor fonográfico há anos, com músicos que, fora da igreja, ajudam a embalar multidões com boa música cantada por não-cristãos, enquanto dentro produzem canções muitas vezes repetitivas e sem criatividade, sem força para ir além do muitas vezes mesquinho e vazio mercado evangélico.

Não conheço Bono o suficiente para saber se ele é um exemplo a ser seguido, mas não posso ignorar a verdade de suas bandeiras. Quando assisto a um megashow como o que ele fez em São Paulo, considerado por muitos o maior show de rock da história do Brasil, não posso deixar de me sentir desafiado e de me identificar com a proposta desses malucos irlandeses. Como político, sempre rejeitei o gueto. Sempre me recusei a, como vereador, me restringir a ser um despachante de igreja, a viver de favores, fechado num mundinho autodenominado cristão.


Nunca entendi que Jesus pregava a salvação para aqueles que fossem "bonzinhos". Entendi que o céu era para aqueles que acolhessem o estrangeiro, para os que desse água ao sedento, comida ao faminto. Talvez seja essa a pergunta perseguida por Bono: o que é a salvação? A julgar por algumas letras e discursos da banda, a salvação é sinônimo de humanização. A partir do momento em que nos tornamos mais humanos, mais parecidos com Jesus nos tornamos. E, acima de tudo, a salvação é para todos, não apenas para um grupo de iniciados.


Para concluir, o U2 nos ensina que o projeto de expressar os valores da Igreja para o além-muro pode dar certo, seja em canções, seja em políticas públicas. Não sei se poderia considerar heresia ouvir uma multidão como a que lotou o Morumbi cantando os versos de "40", composição do CD "War", na qual Bono é explícito em sua fé. Na música, ele diz: "You set my feet upon a rock. And made my footsteps firm. Many will see, many will see and hear (Você pôs meus pés sobre a rocha. E firmou os meus passos. Muitos verão, muitos verão, e ouvirão)". Posso dar o testemunho de quem viu isso ao vivo, como eu. É emocionante. Ouvir o nome do Senhor exaltado dessa forma é de arrepiar.

CARLOS BEZERRA JR. é médico ginecologista e obstetra, pastor da Comunidade da Graça e vereador de São Paulo

sexta-feira, abril 20, 2007

A pessoa errada

Para os invariavelmente apaixonados de plantão...

Pensando bem, em tudo o que a gente vê, e vivencia, e ouve e pensa, não existe uma pessoa certa pra gente.

Existe uma pessoa que, se você for parar pra pensar é, na verdade, a pessoa errada.

Porque a pessoa certa faz tudo certinho.

Chega na hora certa,

Fala coisas certas,

Faz coisas certas,

Mas nem sempre a gente tá precisando das coisas certas.

Aí é a hora de procurar a pessoa errada.

A pessoa errada te faz perder a cabeça,

Fazer loucuras,

Perder a hora,

Morrer de amor.

A pessoa errada vai ficar um dia sem te procurar

Que é pra na hora que vocês se encontrarem

A entrega ser muito mais verdadeira.

A pessoa errada, é na verdade, aquilo que a gente chama de pessoa certa

Essa pessoa vai te fazer chorar

Mas uma hora depois vai estar enxugando suas lágrimas

Essa pessoa vai tirar seu sono

Mas vai te dar em troca uma noite de amor inesquecível

Essa pessoa talvez te magoe

E depois te enche de mimos pedindo perdão

Essa pessoa pode não estar 100% do tempo ao seu lado

Mas vai estar 100% da vida dela esperando você.

A pessoa errada tem que aparecer pra todo mundo

Porque a vida não é certa

Nada aqui é certo

O que é certo mesmo, é que temos que viver cada momento,

Cada segundo,

Amando, sorrindo, chorando, emocionando, pensando, agindo,

querendo, conseguindo

E só assim é possível chegar àquele momento do dia

Em que a gente diz: "Graças à Deus deu tudo certo"

Quando na verdade

Tudo o que Ele quer

É que a gente encontre a pessoa errada

Pra que as coisas comecem a realmente funcionar direito pra gente...

Nossa missão: Compreender o universo de cada ser humano,

Respeitar as diferenças, brindar as descobertas, buscar a evolução.

Luis Fernando Veríssimo

quinta-feira, abril 19, 2007

Perseverança

Quem ama quer, e aquele que quer relampeja e cintila. A resolução enche os olhos de fogo; admirável fogo que se compõe da combustão de pensamentos tímidos.

Os teimosos são os sublimes. Quem é apenas bravo tem um assomo, que é apenas valente tem só um temperamento, quem é apenas corajoso tem só uma virtude; o obstinado na verdade tem a grandeza. Quase todo o segredo dos grandes corações está nesta palavra: perseverando.

A perservança está para o coração como a roda para a alavanca; é a renovação perpétua do ponto de apoio. Esteja na terra ou no céu o alvo da vontade, a questão é ir a esse alvo; no primeiro caso, é Colombo, no segundo caso, é Jesus.

Insensata é a cruz; vem daí a sua glória. Não deixar discutir a consciência, nem desarmar a vontade, é assim que obtêm o sofrimento e o triunfo. Na ordem dos fatos morais o cair não exclui o pairar. Da queda sai a ascensão.

Os medíocres deixam-se perder pelo obstáculo especioso; não são assim os fortes. Perecer é o talvez dos fortes, conquistar é a certeza deles. Podes dar a Estevão todas as boas razões para que ele não se faça apedrejar. O desdém das objeções razoáveis cria a sublime vitória vencida que se chama o martírio.

Victor Hugo em "Os Trabalhadores do Mar" - tradução de Machado de Assis - Editora Nova Alexandria.

segunda-feira, abril 16, 2007

Como não Te amar?

Como não Te amar ?
Se mesmo na primavera da minha vida
Nos anos da infância, de alguma forma
Eu sabia, sabia que Você existia
E que comigo estava do nascer do Sol até o cair da Noite
E que eu ouvia sua voz, mesmo sem som, me dizendo "Estou aqui"

Como não Te amar?
Se nas horas de tristeza, me olhou nos olhos
No profundo de minha alma, me trouxe conforto, abrigo e amparo
Se quando o universo ruiu, senti Sua mão me apoiando
E Seu beijo doce me trouxe vida.

Como não Te amar?
Se esteve comigo quando sorri
Me consolou quando chorei
e me guiou nas Trevas das indecisões de meu ser

Como não Te amar?
Se teu olhar, me leva muito além do que meus olhos podem ver
Se em Teus braços encontro o calor que necessito
para sobreviver nesse mundo frio e sem sentido.

Como não Te amar?
Se não disse que eu queria ouvir, mas o que eu precisava ouvir
Se me conhece melhor que eu mesmo, e me penetra a alma com sua
Palavra

Como não Te amar?
Se todas as vezes que na minha jornada meus pés se feriram
e sem que eu pudesse caminhar, Você me carregou no colo sorrindo.

Como não Te amar?
Se todas as vezes que suspirei, que falei de amor, que perdoei
e que aprendi o valor do perdão, era Você que sorria através de
mim.

Como não Te amar?
Se sorriu comigo, e me aceitou como sou
E me aceitando me ajudou a crescer.

Como não Te amar?
Se apesar de todas as vezes que eu te ignorei
Você insistiu em não me esquecer.

Muito obrigado

A sutileza das definições...

Quando me amei de verdade,
compreendi que em qualquer circunstância, eu estava no lugar certo, na hora certa, no momento exato. E, então, pude relaxar.
Hoje sei que isso tem nome...
auto-estima.

Quando me amei de verdade,
pude perceber que a minha angústia, meu sofrimento emocional, não passa de um sinal de que estou indo contra as minhas verdades.
Hoje sei que isso é...
autenticidade.

Quando me amei de verdade,
parei de desejar que a minha vida fosse diferente e comecei a ver que tudo o que acontece contribui para o meu crescimento .
Hoje chamo isso de...
amadurecimento.

Quando me amei de verdade,
comecei a perceber como é ofensivo tentar forçar alguma situação ou alguém apenas para realizar aquilo que desejo, mesmo sabendo que não é o momento ou a pessoa não está preparada, inclusive eu mesmo.
Hoje sei que o nome disso é...
respeito.

Quando me amei de verdade,
comecei a me livrar de tudo que não fosse saudável ... pessoas , tarefas, tudo e qualquer coisa que me pusesse para baixo.
De início, minha razão chamou essa atitude de egoísmo.
Hoje sei que se chama...
amor-próprio.

Quando me amei de verdade,
deixei de temer meu tempo livre e desisti de fazer grandes planos, abandonei os projetos megalômanos de futuro.
Hoje faço o que acho certo, o que gosto, quando quero e no meu próprio ritmo . Hoje sei que isso é...
simplicidade.

Quando me amei de verdade,
desisti de querer ter sempre razão e, com isso, errei muito menos vezes.
Hoje descobri a...
humildade.

Quando me amei de verdade,
desisti de ficar revivendo o passado e de me preocupar com o futuro.
Agora, me mantenho no presente, que é onde a vida acontece.
Hoje vivo um dia de cada vez.
Isso é...
plenitude.

Quando me amei de verdade,
percebi que a minha mente pode me atormentar e me decepcionar. Mas quando eu a coloco a serviço do meu coração, ela se torna uma grande e valiosa aliada.

Tudo isso é.... saber viver!

Texto retirado do Caminho em Mesquita-RJ

quinta-feira, abril 05, 2007

Páscoa

Páscoa é época de ressureição
ressurreição de amor
ressureição de vida
ressureição de momentos felizes.
Mas também serve para mostrar que por mais que o sepulcro esteja fechado e você acredite que as circunstâncias desse mundo escuro te venceram e te encerraram na escuridão de suas dores e tristezas.
A porta do sepulcro vai abrir, e você vai experimentar de novo a luz do Sol e o cheiro da vida.
Como Cristo ao terceiro dia ressucitou, que o Amor de Deus e a Graça de Jesus ressucitem na sua vida.
Então nessa páscoa, coma muito chocolate e celebre a vida, um presente de Deus para nós.
Feliz Páscoa

quarta-feira, abril 04, 2007

Um pouco de Fernando Pessoa

"Deus costuma usar a solidão
para nos ensinar sobre a convivência.
Às vezes, usa a raiva,
para que possamos compreender
o infinito valor da paz.

Outras vezes usa o tédio,
quando quer nos mostrar a importância da
aventura e do abandono.

Deus costuma usar o silêncio para nos
ensinar sobre a responsabilidade
do que dizemos.

Às vezes usa o cansaço,
para que possamos compreender
o valor do despertar.

Outras vezes usa doença,
quando quer nos mostrar
a importância da saúde.

Deus costuma usar o fogo, para nos ensinar
sobre água.

Às vezes, usa a terra,
para que possamos compreender o valor do ar.

Outras vezes usa a morte,
quando quer nos mostrar
a importância da vida".

sexta-feira, março 30, 2007

Hoje minha alma pede descanso

Hoje eu amanheci diferente.
Tive uma sensação de nostalgia, saudade das coisas que não voltam mais, tive um sensação de tristeza, lembranças dos meus erros que ecoam na minha alma, das escolhas erradas que tomei, das pessoas queridas que magoei.
Hoje eu acordei assim, querendo silencio, querendo descanso.
Me senti solitário, sem alguém para compartilhar essa sensação, falar das coisas que em machucam a alma, então me recolhi em minhas orações buscando um amparo e um conforto.
Não que fosse ruim, acredito que todos precisam de momentos de reflexão, para se fixarem um pouco na realidade e não viver voando no mundo dos sonhos impossíveis, sem conexão com o que é palpável e sólido.
Por isso, hoje minha alma pede descanso. Não que eu não goste de como minha vida está. Deus sabe o que enfrentei nos últimos meses e o quanto Ele me ajudou a continuar de pé, no pequeno barco chamado "Vitor" enquanto a tempestade da minha existência tentava me derrubar. Estou bem, mas às vezes existem alguns "espinhos na carne" que machucam, mas são necessários para nos manterem conectados a realidade, e acho que meu espinho hoje doeu um pouco.
Minha alma não está chorando, não está vazia, e nem caída no desespero destruidor da solidão.
Não
Ela apenas está um pouco cansada, como qualquer um que tendo trabalhado intensamente, se cansa.
Então hoje vou só me desconectar um pouco, e cuidar do espinho que ainda dói.
Paz e Felicidades para todos

domingo, março 25, 2007

Liberdade

"E conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará"-Jesus Cristo
Liberdade. Uma palavra tão simples mas com um significado tão profundo, que as vezes se perde nas estreitas vias de nossa alma.
Ser livre, implica em não ter restrições impostas por outrem, poder trilhar os caminhos que quiser, ladrilhar a estrada da própria existência como as cores que mais nos agradam. Mas a questão não é tão simples quanto parece, nem tem tão poucas implicações existênciais para o ser humano.
Ser livre também indica que as consequências de nossas escolhas, quer sejam boas ou ruins, serão atribuídas diretamente a nós, sendo que não podemos imputar isso a ninguém uma vez que nossa foi a escolha. Além do mais a liberdade pode sempre parecer apetitosa para nós, mas não queremos, às vezes, essa liberdade para alguém muito próximo de nós, seja por ciúme, insegurança, inveja ou medo.
Tememos por acreditar que a liberdade nos induz ao erro. Nada mais absurdo poderia ser dito.
Quando Jesus tratou desse tema, atrelou liberdade intimamente ao conhecimento da Verdade.
Conhecer a Verdade, nós revela algo muito além daquilo que nos cerca. A Verdade conhecida desnuda o ser humano para si mesmo. E esse ato de estar "pelado" diz respeito não ao que é exterior, mas ao que é interior.
Somos desnudados de nossas ilusões, de nossos falsos juízos, de nossas desculpas, de nossas projeções para os outros, de nossas máscaras, e de nosso "eu exterior", aquela imagem que montamos para os outros enxergarem, que é repetida tantas vezes por nossas dissimulações que absurdamente assumimos como verdade mesmo sabendo que não passa de uma mentira.
Logo estamos livres ao conhecermos a Verdade intimamente, somos confrontados com nós mesmos, sem nenhum tipo de roupagem ou de qualquer nova rota de fuga que criamos para justificar tudo aquilo que fazemos e que de alguma forma, nos trás deformidades existenciais, angústias psicológicas e medos da alma.
Ora então qual é o problema?
O problema é que ninguém quer se enxergar como é, porque vai ter que confrontar a origem de seus medos, origem que demorou-se uma vida inteira para encobrir.
Quando você se reconhece, você acaba conhecendo as origens de tudo que há em você, logo adquire a responsabilidade de aprender e se aprimorar, não podendo imputar a ninguém a falhas de seus atos, ou qualquer consequência que eles tragam, para o bem ou para o mal. Começa-se a aprender a caminhar com as próprias pernas, e deixa-se qualquer dependência cega da mente de outrem.
No fim, a liberdade gerada pelo conhecimento da verdade, gera aprendizado de si mesmo, de modo que quanto mais livre sou, menos erros cometo. No entanto muitos usam de suas liberdade para vetar a liberdade do outro. Somos livres mas não para causar qualquer tipo de destruição no outro. Liberdade também exige responsabilidade, de modo que só sou realmente livre quando respeito os direitos do outro, não por imposição, mas por consciência da necessidade do outro. Caso contrário estaríamos nos aprisionando de novo á um senso distorcido de liberdade que na verdade impõe suas necessidades para os outros, gerando uma corrente de disturbios e tristezas para todos que nos cercam, e mais a longo prazo para nós mesmos. É como se vivessemos em uma jaula enorme, que é preparada com todos os elementos de um mundo livre, para dar a falsa sensação de liberdade. Mas com o tempo se você tentar ir além do horizonte que sua vista alcança, vai encontrar as mesmas grades.
Viver livre, não significa não ter princípios. Mas significa estabelece-los por si mesmo e compreender o valor que eles têm para você, e não pelo valor que eles possuem para outros.
Conhecer a Verdade trás grande Paz interior, mas também trás grande responsabilidade.
Mas é uma caminhada imprescíndivel para todo aquele que quer crescer e fugir do mundo das auto-ilusões. Encontrando e o mais importante, sendo encontrado pela Vida. Então prepare-se para ser livre.
"Eu sou o Caminho, a verdade e a Vida"- Jesus Cristo.

segunda-feira, março 12, 2007

O que eu posso

Para uma grande amiga chamada Larissa...
Eu não posso acabar com todos os seus problemas, duvidas ou medos, mas posso ouvir você e juntos podemos procurar soluções
Eu não posso apagar as mágoas e as dores do seu passado nem posso decidir qual será o seu futuro, mas no presente eu posso estar com você se precisar de mim.
Eu não posso impedir que você leve tombos, mas posso oferecer minha mão para você agarrar e levantar-se.
Suas alegrias, triunfos, sucessos e felicidades não me pertencem, mas seus risos e sorrisos fazem parte dos meus maiores bens.
Não é de minha alçada tomar decisões por você, nem posso julgar as decisões que você toma, mas eu posso apoiar, encorajar e ajudar se me pedir.
Eu não posso traçar ou impor-lhe limites, mas posso apontar-lhe caminhos alternativos, procurar com você medidas de crescimento, formas de encontrar-se, meios de ser você mesma sem medo de rejeição.
Eu não posso salvar o seu coração de ser partido pela dor, pela mágoa, perda ou tristeza, mas posso chorar com você e ajuda-la a juntar os pedaços.
Eu não posso dizer quem você é ou como deveria ser .
Eu só posso amar você e ser seu amigo.

domingo, fevereiro 18, 2007

Ira

O texto que se segue é de autoria do pastor Ricardo Gondim
Aproveitem

Sou pastor de uma comunidade cristã em São Paulo; lidero uma rede de igrejas espalhadas pelo Brasil, somando entre 20 e 25 mil pessoas; conduzo um programa de rádio diário também em São Paulo; escrevo para duas revistas de circulação nacional e, porque mantenho um site na internet, sinto-me membro da novíssima comunidade dos blogueiros.

Apesar disso, minha capacidade transformadora é pífia. Minha voz, semelhante a de milhões de brasileiros, não representa quase nada; não sou conhecido das elites, nunca estive na presença de um presidente da república e jamais usei um passaporte diplomático.

Partilho do sentimento de impotência que toma conta dos meus irmãos. Sinto-me frustrado, revoltado, irado, indignado, sei lá que expressão usar, com tudo o que ocorre na minha terra.

Assisti a eleição dos novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado com uma vontade louca de comprar um megafone, ir para Brasília, e ficar gritando palavrões em plena praça pública. Tive impulso de chamar aqueles políticos arrumadinhos, empertigados dentro de seus ternos novíssimos, posando, feito jacus, para fotografias, com as palavras mais chulas da gíria portuguesa .

Entendo que o jogo político é necessário; sei que disputas de poder acontecem em todas as instituições; compreendo que “ruim com os deputados, pior sem eles”.

Ninguém precisa me dar aula de democracia (sou filho de um preso político na ditadura e sei o horror dos tiranos), mas, mesmo reconhecendo a necessidade das instituições, fiquei vermelho de raiva com a inauguração do novo Congresso.

Vejo meu país sangrando e os mesmos chavões sendo repetidos. Sinto que vivemos em meio a um desdém aviltante.

Ninguém mais se lembra da aluna de uma universidade do Rio de Janeiro, vítima de uma bala perdida, e que ficou tetraplégica; ninguém mais se lembra daquele senhor que chorava enquanto desenterravam seu filho de debaixo da cama de um soldado da Polícia Militar; ninguém mais se lembra da fotografia de uma adolescente se prostituindo, sentada no colo de um velho nojento do Amazonas; ninguém mais se lembra das mães que enterraram seus filhos, mortos por falta de asseio numa Unidade de Tratamento Intensivo de um hospital público.

Dois dias depois das tragédias, chegam outros sinistros mais pavorosos e vamos nos acostumando; de horror em horror chegaremos no inferno preparado pelos próprios brasileiros.

Querem saber? Chega...

Para mim chega, já que os evangélicos degringolaram e hoje a grande maioria dos freqüentadores dos cultos é composta de pessoas infantilizadas pela religião; noto que o movimento do qual já fiz parte não se importa com a justiça nacional, não chora com os que choram e não defende o direito dos mais frágeis. Eles se reúnem em seus auditórios com uma única preocupação: acessar o divino, para se safarem.

Para mim chega, já que vejo a elite burguesa se locupletando há séculos, sem que ninguém consiga fazê-la mudar. Ela é preguiçosa, mesquinha, egoísta e insensível à miséria que vive do outro do lado do muro de seus condomínios. A elite brasileira se preocupa prioritariamente em blindar seus carros, freqüentar desfiles de moda breguíssimos em shoppings centers, freqüentar os mesmos cabeleireiros badalados e caros das modelos analfabetas, sair, feito “papagaio de pirata”, nas páginas das revistas de fofoca e comprar roupas em Miami. Ela não está nem aí para a miséria que cresce sem parar.

Para mim chega, já que os intelectuais nacionais atolaram na irrelevância de seu esnobismo; trancaram-se em suas torres de marfim, com textos herméticos e propostas mirabolantes e inúteis dos teóricos de direita ou de esquerda.

Imóvel e impotente, tenho vontade de chutar o mastro central desse grande circo de lona rasgada, chamado Brasil.

Não passamos de um povinho sem sangue nos olhos, uma nação sem brios.

Faltam poucos dias para o país parar de novo para ver as escolas de samba, patrocinadas pelo tráfico, desfilarem a nudez das mulheres mais deslumbrantes que nossa raça produziu.

Os poucos gringos com uma libido maior que o medo de morrer, vão babar. E nós, sentaremos em nossas poltronas por quatro dias, embriagados de cerveja e sexo esqueceremos que já perdemos nossa alma.

Morreu um menino e estou com asco dos brasileiros que elegeram o Clodovil, o Maluf, o Genoíno, o Palocci, o Collor, o Sarney e toda aquela farsa chamada de Congresso Nacional. Sinto náuseas e o meu inferno são os próprios brasileiros.

Morreu um menino e não posso dormir sem antes dizer que, se pudesse, diria aos meus patrícios que a nossa perversidade está transbordando a medida da ira divina.

Morreu um menino, mas o pior ainda está por vir.

Morrerão muitos outros e continuarão as mesas redondas de idiotas discutindo as fofocas do futebol.

Morrerão muitos outros e a Daslu continuará vendendo calças jeans de 2 mil dólares.

Morrerão muitos outros e alguns poucos continuarão tomando vinho de 7 mil dólares em banquetes faustosos.

Morrerão muitos outros e os pastores continuarão prometendo abrir portas de emprego para quem der dinheiro em seus cultos.

Cansei do deboche e não sei o que fazer. Estou revoltado com o cinismo e não sei para onde me voltar.

Antes que esqueça: o nome do menino era João Hélio e seus pais ainda estão chorando muito...

Soli Deo Gloria

Uniões contaminadas

O texto abaixo foi retirado do Site do Caio
Achei muito interessante e pertinente.
Aproveitem

Vitor



Tem gente que pensa que gente se entrega a outra gente e nada acontece. Tem gente que se dá a outra gente sem saber que a gente é feita de gente. Tem gente que se ilude com a idéia de que gente não transfere gente para outra gente. Tem gente que não entende que gente é contagiada quando se faz ‘um’ com outra gente. Tem gente que pensa que é brincadeira quando Deus diz pra gente não misturar o espírito com o espírito de certas gentes.

Sim, gente passa gente pra gente!

“Serão os dois uma só carne...”

“Faz-se um com ela...”

“Grande é este mistério...”

Paulo disse que na união conjugal tais ‘misturas’ atingem seu clímax para o bem, mas também pode ser para o mal.

Ele diz: “...dela cuida como de sua própria carne...”

E mais: “... posto que já não são dois, porém um...”

E em outro lugar: “... a mulher crente, santifica o marido incrédulo... de outra sorte seriam impuros...”


Eu creio em vampiros psicológicos, em seres que comem você por dentro, em relacionamentos que são como o ‘bicho da goiaba”, o amazonense “tapurú”.

Ninguém se une a ninguém sem contágio, para o bem ou para o mal.

Uniões têm o poder de mudar interiores, alterar almas, atingir o espírito.

Se alguém sai de casa e contrata uma prostituta, e faz isso uma vez, corre o risco de contaminar-se fisicamente, e, pode desenvolver um vício para a alma.

Mas se alguém sai de casa sempre para se prostituir, essa pessoa, mesmo que mude de prostituta todas as vezes, será contaminada, não necessariamente no corpo, e não necessariamente pelo espírito de uma delas, mas com certeza o será pelo “espírito de prostituição”, que não é algo muito forte na prostituta—que não se entrega por prazer—, mas o é na alma do freguês, visto que ele sim, procura ‘algo’ com avidez física e psicológica.

Amizades longas com pessoas ruins podem acabar com a gente. Mas amizades curtas e breves também têm o poder de contaminar, e desviar um ser humano de seu caminho.

Nada, porém, é mais profundo no seu poder de contágio do que uma união conjugal.

Nesse caso, se as pessoas são de espírito bom, mesmo que não se amem, provavelmente não se façam mal.

Mas se ambas ou apenas uma delas for de ‘outro espírito’, então, é muito difícil que o parceiro não seja contaminado na alma.

Por esta razão nada há melhor do que a união de duas pessoas do mesmo bom espírito, especialmente se tiverem a ventura de se encontrar bem cedo na vida, e se manterem em união por toda a vida.

Tais pessoas são as mais leves, livres, felizes, e simples!

Há quem queira muita ‘variedade’...

Meu Deus, que ilusão!

Mal sabem que a tal ‘variedade’ vai deixando gambiarras penduradas pela gente, como fios desencapados e ‘em curto’.

Se pudéssemos ver espiritualmente tais pessoas, as veríamos como troncos cheios de cabeças, braços, olhos, e pernas.

Sim, completamente monstrificadas...

Simbiotizadas de tantas formas e de tantas maneiras, que elas mesmas assustar-se-iam se pudessem se enxergar.

Mas não é preciso enxergar para ver. Basta que se olhe para dentro do coração, para as legiões de seres..., para sentimentos que cada vez mais se complexificam na alma, para mentes cada vez mais compartilhadas pelos entes psicológicos que foram sendo agregados no caminho.

Por isso o homem de coração simples é bem mais feliz do que aquele que sofisticadamente se auto-designa de complexo.

Quando a sabedoria ordena ao jovem que guarde puro o seu coração, que simplifique os seus caminhos, e que seja focado em seus sentimentos, ela quer apenas dizer o que acabei de expor.

Sim, não é nada moral, como se pensa. Mas sim é algo que tem a ver com a saúde do ser, com a paz para viver, com a unicidade existencial, com a pureza psicológica.

Hoje, porém, é moda ser infeliz, complexo, sensível (significando ‘sofrido’), indecifrável, misturado, multiuso..., de tal modo que essa pessoa tem que ter ‘seu próprio analista’.

Toda gente é uma ‘mistura’ de todas as gentes que passaram pelo coração, para o bem e para o mal.

Nessa viagem da formação do ser há aquelas pessoas que são inevitáveis para nós, como os pais e os irmãos—nossos primeiros e involuntários casamentos na existência.

Ora, muitos são os estragos que essa ‘mistura’ pode causar quando mal discernida.

As piores misturas, todavia, são aquelas que escolhemos—consciente ou inconscientemente—para viver e fazer parte da gente pela via da união.

Uniões são coisa muito séria...

Sim, elas podem nos erguer ou nos afundar; podem nos abençoar ou nos amaldiçoar; podem nos trazer paz ou podem nos trazer angustias; podem nos salvar ou nos destruir.

Por isso, se você está só, ou vindo de algo que como ‘união’ fez mal a você, não tenha pressa. Abrace sua solidão com respeito e dignidade, e agradeça a Deus o livramento. E não sucumba à tirania de se fazer acompanhar. Afinal, veja bem quem vai lhe ‘acompanhar’.

Mas se você está lendo isso e pensando: “E agora? Depois de tanto ‘experimento’, ainda haverá esperança para mim?”

Eu lhe digo:

Sempre há esperança. O Espírito Santo é real. O amor de Deus limpa e cura. Mas o homem haverá de ser curado enquanto discerne cada pedaço de outros que foram largados no baú de sua alma. E terá que ter a coragem de discerni-los e jogá-los para fora de si mesmo.

Ora, tal cura implica em discernir ‘qual carne e qual sangue’ fazem parte de nossa ‘comunhão’ existencial e espiritual. E obviamente isto só tem a ver com quem permitimos entrar e ter algum pedaço de nós, especialmente em uniões.

Tal exercício de discernimento é doloroso, porém libertador.

E se você discernir tais espíritos na presente constituição de sua alma, mande-os sair... pois eles sairão.

Depois disso, todavia, encha a sua ‘casa’ do que é bom, e não a deixe vazia, posto que essas coisas se vão... mas de vez em quando voltam a fim de ver como anda o lugar antes ocupado, conforme nos ensinou Jesus, tanto sobre espíritos demônios, quanto também acerca de qualquer espírito, inclusive os espíritos dos humanos que já nos possuíram ou tentaram faze-lo.

Esses ‘entes’, todavia, cansam de voltar. E é assim que se vai alcançando paz mais e mais...

Ora, é por tudo isso que lhe peço:

Veja bem com quem você está se unindo.

E mais:

Veja bem que espíritos você contraiu durante vínculos adoecidos.

E, assim, trazendo todas as coisas para a luz, deixe que a verdade expurgue de seu ser aquilo que não é você.

E não esqueça:

É na Luz e na Comunhão verdadeira que o Sangue de Jesus nos purifica de todo pecado.


“Pois se andarmos na luz, como Ele na luz está; mantemos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus Seu filho, nos purifica de todo pecado”.


Nele,



Caio

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Minha Fortaleza

Eu caminhei durante anos no deserto de minha vida, carregando comigo as poucas coisas realmente importantes, que tinham algum significado para mim. Coisas que marcaram minha vida, e que de modo nenhum eu abandonaria. A estrada tinha sido longa, cansativa, mas no fundo recompensadora. Já havia passado por tantas tormentas, me fortificado tanto, que um dia, enquanto parava numa fonte de águas para matar a minha sede, olhei meu próprio reflexo na àgua, me reconhecia, mas estava tão diferente. Mais velho robusto, com um tom de serenidade no rosto que parecia inabalável, mas que no fundo carregava uma aura de medo no futuro. Os olhos estavam mais cansados, porém mais profundos. Escondiam algumas tristezas, mas muitas alegrias durante a caminhada.
Cavalguei durante muito tempo no deserto, procurando um lugar para me fixar, cansado dessa vida nômade, vivendo de alegria em alegria, de tristeza em tristeza, mas sempre combatendo um combate solítário, amparado apenas pelos meus tesouros pessoais, os quais carreguei por toda a minha vida, e por minha fé, que tinha me guiado nos momentos de escuridão, e me mostrado a saída das Tempestades, o Criador o sabe.
Mas a caminhada já se fazia longa, e eu não mais queria encontrar as tormentas do caminho, queria encontrar um abrigo onde podia morar em paz, e cultivar meus tesouros com serenidade e sabedoria, onde eu pudesse encontrar o melhor que há em mim.
Foi quando eu avistei a primeira morada, no horizonte além das dunas, podia se ver o despontar de suas torres no vento do deserto. Meus olhos se fixaram no horizonte e eu exitei por um instante, era um caminho diferente do que eu costumava a seguir, não conhecia essa nova direção, mas meu atual caminho se perdia ao longe sem me mostrar nenhuma esperança de encontrar uma morada, enquanto esse, mesmo que desconhecido, poderia me levar e encontrar o local de origem das torres que se despontavam no horizonte.
Quão difícil foi a decisão daquele dia. Durante alguns instantes fiz uma oração ao Criador, pedindo sua proteção para essa nova jornada, subi em meu cavalo e caminhei para meu novo destino. Meu antigo caminho se perdia atrás de mim, até que finalmente não pude mais observá-lo. Agora, só me restava prosseguir para encontrar a morada.
Aqueles foram dias de ansiedade, a cada dia as torres iam se definindo no horizonte, e onde havia areia, começou a aparecer a vegetação, plantas pequenas iam surgindo pelo caminho, preenchendo espaços entre uma duna e outra, até que as dunas começaram a ficar menos frequentes, dando espaço para uma vegetação rasteria cada vez mais presente. No horizonte a construção a qual pertenciam as torres se definia. Era como um Castelo enorme, rodeado por uma extensa muralha, quatro torres maiores se posicionavam nas quatro direçôes cardinais. A muralha era de um branco acinzentado muito marcante, que adquiria um contraste profundo com o verde fosco da vegetação ao seu redor. Não avistei ninguém a princípio, mas ainda estava a uma certa distância do Castelo.
Aumentei a intensidade de minha marcha, o Sol logo iria se por e eu não queria estar longe dos portões em terras desconhecidas.
Quando cheguei ao pé da muralha, não havia guardas nas torres, nem portão que proibísse a entrada pelo arco principal, também não existia fosso ou algo parecido, para dificultar o acesso a muralha ou ao arco de entrada. Foi quando eu percebi que da base do muros saiam pequenos canais que se estendiam por linha reta vários metros a frente invadindo o campo de vegetação em torno do Castelo, dos canais saia uma àgua limpa, cristalina como eu nunca havia visto antes parei o cavalo ao lado de um dos canais desci e mergulhei minha mão do pequeno riacho que corria por ele. A água não era nem quente nem tão fria, mas era resfrescante, enchi a palma de minha mão e levei um pouco até minha boca. Não tinha gosto, mas ao prová-la percebi uma suavidade e vitalidade doces entrarem em minha alma. Percebi que provavelmente todo o terreno verde ao redor do Castelo era irrigado por esse canais, isso explicava porque numa terra tão árida onde as chuvas são tão escassas poderia haver tanta vida. A água vinha de dentro do Castelo.
Me apressei para chegar ao arco de entrada, era todo esculpido de modo tão belo, mas também tão simples, que eu poderia ficar olhando por horas a fio, ao cruzar o arco pude ver uma das coisas mais belas que eu jamais vi em minha vida. A muralha simples e as quatro torres escondiam dentro de si um jardim ornamentado com uma diversidade de árvores e plantas incríveis, havia pequenas construções que se mesclavam com as árvores a ponto de não se perceber o que era construção e o que era árvore. As árvores eram brancas acinzentadas como os muros e as contruções, de modo que tudo parecia feito do mesmo material, tudo parecia carregar vida dentro de si.
O jardim era circular como a muralha, começava na base do muro e se estendia até chegar ao centro do pátio não havia uma contrução que não fizesse parte do jardim e não havia nenhuma parte do jardim, que em si mesmo não fosse ornamento de uma construção. Tudo tão harmonico e perfeito.
Chegava a ser ímpossível definir se tudo era jardim ou uma pequena cidadela. Na verdade era um misto de ambos. Pequenos caminhos, pavimentados com o mesmo tipo de material se estendia pelo meio do jardim, servindo de passagem para as diversas partes do castelo, creio eu.
Caminhei por algum tempo pelos caminhos, até encontrar o centro do pátio e consequentemente o centro do jardim. Lá onde tudo parecia se originar, e para onde tudo apontava, havia uma fonte. Esculpida a partir de uma parte que parecia brotar do próprio chão, a fonte era de uma arquitetura simples, mas singelamente bela. De uma beleza encantadora, e dela brotava a àgua que irrigava os canais, que se originavam na fonte, corriam e atravessavam o pátio e iam desembocar no terreno fora das muralhas.
A fonte trazia vida a tudo que existia no castelo, e fora dele, não havia uma árvore ou planta do jardim que não fosse irrigada pelas águas cristalinas da fonte.
Em torno da fonte haviam flores, muitas flores, de diversos tipos e cores, que eu não conhecia. Todas elas exalavam um perfume suave mas marcante e pintavam com suas cores uma alegria sem igual em torno da fonte, como se quisessem marcar o ponto inicial e final de toda a vida ao redor.
Me ajoelhei e beijei o chão onde pisava, agradeci ao Criador por ter encontrado um lar, uma fortaleza para me refugiar.
Aqueles foram dias felizes, de manhãs de Sol, cuja luz refletia no branco de tudo e iluminava tudo ao redor, eu sentia o calor que emanava de tudo quanto existia no jardim, pois tudo quanto existia pulsava de vida e me contaminava de uma forma que eu acreditei ser irreversível. Coloquei meus tesouros ao lado da fonte de forma que eu pudesse olhar todos os dias e perceber que o Criador me abençoou com tudo o que eu havia encontrado, e que toda minha vida tinha me levado até ali. Eu ouvia a vida que corria pelo jardim, pequenos animais que alí existiam, os frutos das árvores dos quais eu me alimentava, a brisa no final da tarde que me aliviava a alma, e o amigos que ali recebi e as vezes que à eles falei de minha alegria por ali estar, e por tudo que eu havia ganho. Eu não amava só aquele lugar, mas tudo o que aquele lugar havia me trazido de bom.
E a noite quando o Sol caía e a lua despontava no céu, o vento batia nas folhas das árvores e produzia uma melodia tão doce e nostálgica que os pássaros de seus ninhos cantavam junto com as árvores uma canção sem nenhuma palavra, mas que me dizia tanto sobre mim mesmo de uma forma tão profunda, e eu adormecia nesse sentimento. Não era só eu que estava naquele lugar, o lugar também já estava em mim.
Até que um dia, o qual jamais esquecerei, enquanto durante o primeiros raios de Sol eu caminhava pelo jardim, encontrei nos fundos do Castelo, um caminho que eu não conhecia, que eu nunca tinha visto ou trilhado, e que se perdia na imensidão a frente.
Fiz esse caminho que havia me levado até uma escada, que descia nas profundezas abaixo.
Pela primeira vez encontrei algo que não era harmonioso com todo o resto. A escada escavada no chão, era de um outro tipo de minério, diferente da muralha e das construções. Era escura e fria, trazia dentro de si uma tristeza inpronuciável. A medida que eu descia sentia frio, muito frio, e a luz ia ficando para trás, e havia um medo crescente que emanava das profundezas para onde a escada me levava.
Parei na metade do caminho, e voltei, com medo de ver o que havia no fim da escada.
Mas o dias nunca mais foram os mesmos. Mesmo com o calor de tudo que emanava, mesmo com a vida ao meu redor, e com as melodias da noite, eu ainda pensava na escada e para onde ela conduzia.
De modo que um dia, eu retornei, e desci até o fim.
Havia uma atmosfera densa e pesada no fim da escada. olhei para cima e a luz do dia mal conseguia ser vista, portanto mal iluminava o que existia a minha frente. Quando terminei de descer, parei em frente a uma porta de madeira maciça. Parecia feita com o tronco das árvores, mas não era branca nem pulsava de vida. Era mais escura, e pulsava com um frio que me gelou a mão.
Era um porão, acredito eu, mas a porta era tão espessa, que quem quer que o tenha feito, o fez para permanecer lacrado.
Havia alguma coisa escrita na fechadura, mas já era tão antiga que não pude ler. Hoje percebo que talvez fosse uma advertência. Advertência que eu infelizmente não levei a sério.
Segurei no metal frio da fechadura, e o puxei com toda a força que eu tinha, aos poucos a porta foi se movendo até abrir.
Nesse momento senti uma rajada de ar frio, que veio de dentro do porão, um ar de certo modo, ancestral, que havia sido aprisionado ali há muito tempo, seco.
Não senti nada maligno, mas havia uma atmosfera de tristeza profunda que me invadiu a alma e pela primeira vez desde que havia chegado eu chorei.
Subi as escadas como uma sensação de vazio por dentro, que aos poucos me dominou.
O dias que se seguiram foram tristes e funebres. Percebi que aos poucos a água, a vida da fonte, começou a secar, e eu via desesperado, toda vida que me cercava ir embora. De algum modo, que eu ainda hoje não sei, o porão fez a fonte secar.
As folhas das árvores cairam aos poucos, não havia mais musica a noite, e eu já não dormia. O pássaros se foram os animais também. Tudo que era de um branco acinzentado marcante, aos poucos foi escurecendo, como a porta do porão.
A paisagem verde do jardim, que me trazia tanta alegria, começou a definhar como o sentimento que eu tinha, e de verde passou para castanho pálido de folhas secas, até que por fim, não existia mais vegetação, nem castanha nem verde.
A fonte finalmente secou, e o Sol da manhã não era mais refletido, mas absorvido, de forma que sempre existia uma penumbra dentro do Castelo. Nem mais as luzes o visitavam.
As Noites era tão silenciosas, a não ser pelo vento, cortante, que trazia um canto solitário de lamento, pelo que um dia foi, mas que já não existia mais.
E durante muitos dias eu caminhava no pátio, de olhos fechados, imaginando como tudo tinha sido, me prendendo a uma lembrança doce, de um passado cada vez mais distante.
Eu estava no lugar, e o lugar estava em mim, de modo que eu também morria aos poucos.
Até que um dia, numa tarde de verão, veio uma tempestade, e choveu pela primeira vez desde que eu havia chegado ali.
E enquanto eu estava sentado no pátio, sendo molhado pela chuva, eu chorei.
Chorei uma dor sem palavras, uma saudade sem tradução, um verdito irrevogável de solidão.
Mas a chuva passou, e um raio de Sol entrou novamente pelas muralhas, e então eu vi o cenãrio desolado que estava ali.
Levantei de alma limpa, olhei para os céus, como quem busca uma resposta do Criador, e percebi, lá no fundo, que aquele não era o meu lugar.
Peguei os meus tesouros ao lado da fonte, meu cavalo, e parti pelo arco principal. Quando cruzei o arco, vi a desolação do campo de areia, que antes era de um verde tão lindo, mas agora era vazio, como tudo o que o cercava.
Circundei a muralha, até achar uma caminho, para uma encosta atrás do castelo. E percebi que a vegetação era mais densa no topo do monte. Ainda existia vida por alí. Respirei fundo, e cavalguei até lá.
Esses são dias esperançosos. No topo da enconsta, não havia castelo ou fortaleza, mas havia um riacho, de águas cristalinas, tão suaves e revigorantes quanto a que eu encotrei no castelo, talvez a fonte se alimente daqui, não sei.
Conheci muitos bons amigos, e redescobri amigos antigos, que hoje percebo, não conhecia de verdade. Com sua paciência e amizade, eles têm me ajudado a construir minha própria fortaleza. Hoje percebo que aprendi muito sobre mim mesmo e sobre onde devo estar. Sei que tenho que construir um porão, pois nem tudo eu quero manter a vista, mas que não devo deixa-lo lacrado. Se ele acumular coisas por muito tempo, pode acabar contaminado o que nexiste de bom.
As manhãs tem sido muito edificantes. meus amigos sempre conversam comigo, e percebendo minha dor, me abraçam. As vezes me dizem coisas bonitas, as vezes ficam apenas em silêncio com um olhar que diz "estamos aqui", e eu me sinto feliz por te-los comigo. No fim da tarde quando todos os passaros cantam e o cheiro da relva me domina. as folhas das arvorés balançam, cantando uma canção, que novamente não tem palavras, mas que me fala profundamente de um novo tempo, de um recomeço, de um novo encontro.
Então eu sento, olho para o céu, e oro para o Criador, agradecendo por essas pessoas que Ele colocou em minha vida, e através das quais, eu acredito profundamente, Ele fala comigo.
Desde que cheguei aqui, todas as manhãs, eu observo o castelo abaixo, triste e vazio, colho algumas flores e desço até lá. Meus amigos se entreolham, e num silêncio passivo, me respeitam, sabendo que nada sai de ninguém da noite para o dia.
Todos os dias eu chegava, ia até a fonte seca, plantava as flores na terra árida, e fazia uma oração, pedindo pelo retorno da vida naquele lugar. No dia seguinte eu retornava com novas, e retirava as flores do dia anterior, mortas e secas pela aridez do solo.
E hoje eu voltei, para o mesmo ritual, e percebi que as flores que eu plantei, não haviam secado, coloquei minha mão na terra e ela estava húmida.
Sorri, pois a vida estava voltando. Ao invés de pedir em minha oração, eu agradeci.
Subi no meu cavalo, e olhei pela última vez tudo ao meu redor, e me veio um sentimento de nostalgia, dos tempos de vida e alegria. A vida estava retornando, o porão talvez, finalmente, estivesse vazio. Havia esperança
Suspirei e disse "Adeus".
Eu não estava mais naquele lugar, e aquele lugar não estava mais em mim.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

Bolo de Fubá

Recentemente, nas festas de fim de ano, viajei para a Enseada das gaivotas, litoral de São Paulo, com toda minha família.
O lugar é muito bonito, e como era de se esperar, tem um comércio voltado para o clima quente de verão. Visitei uma sorveteria num fim de tarde, onde o sistema era self-service, existiam muitas dessas lá. A variedade de sabores era enorme, assim como, a variedades de coberturas, caldas, frutas e grãos que se podia adicionar ao sorvete. As combinações eram praticamente infinitas, ou bem próximas disso. Como meu estomago fala mais alto nessas situações, não pude me contentar com uma combinação simples, então tentei experimentar a maioria das coberturas, grãos e frutas possíveis de uma única vez. O sorvete ficou bem colorido, vistoso e até mesmo apetitoso. Mas quando fui provar percebi que tinha criado uma sobremesa hiperdoce, que tinha um pouquinho do sabor de tudo, mas que na verdade não se parecia com nada, muito menos com sorvete... A mistura de diversos elementos que fiz, não me permitia saborear o sorvete que existia debaixo de tudo aquilo. Paguei caro, e infelizmente, não aproveitei nada.
Minha avó, não sabia ler e escrever, sempre foi muito simples, mas era uma cozinheira de mão cheia, passei parte de minha infância e adolescência com ela, e de longe o que eu mais gostava de experimentar era o seu bolo de fubá. Ela decorava a receita, como se fazia antigamente, medindo em xícaras e colheres, tinha até uma xícara específica, vermelha, para fazer as medidas. Simples, rápido e fácil, mas muito melhor do que qualquer bolo que eu tenha provado em qualquer doceria durante minha vida.
Pensando nisso, e graças a uma metáfora que o Carlos fez numa reunião do Caminho da Graça aqui em Campinas, que passei a ver como na ânsia de "melhorar" o que por si só já é bom, é que nós perdemos a noção do sabor que a simplicidade possui.
Não consigo mais olhar para o que hoje se chama "Igreja Evangélica Brasileira", salvo raras excessões, e não ver um bolo todo enfeitado e cheio de glacê, para se tornar mais atraente para o "público".
Virou, literalmente, moda colocar confeite nos ajuntamentos ditos "cristãos" hoje e dia. Poucos buscam a simplicidade do Galileu que anunciava nos montes, nas praias e nos jardins a mensagem do perdão, do amor, da reconciliação e da ressurreição. Um homem que só pregava nos locais "oficiais" da religião, até que fosse expulso, pois não estava interessado na mediocridade daqueles que se julgavam "gestores" das intenções de Deus na Terra, e que não negociava, nem fazia média com ninguém, mas buscava através de comparações simples, mostrar o princípio mais profundo do Reino de Deus, a comunhão e o amor a Deus, que só se manifesta no amor ao meu irmão.
E o bolo era assim, sem "glacê" de lugar santo, sem "confete" de justiça própria ou "granulado" de controle de almas humanas.
Continha os elementos necessários para o crescimento, "dois ou três, em meu nome" disse Jesus, e o fermento de amor os fazia expandir mais e mais. Ora ninguém escolhe um bolo pela forma que tomou, devido a fôrma na qual foi posto. Um bolo não se mede, pelo fato de ser redondo, retangular, ser em forma de anel, como um pudim, ou em diversos andares. É fato que isso impressiona a princípio, mas se a massa não for boa, nem mesmo um bolo de casamento fica bom.
Logo um bolo cresce e toma a forma da fôrma que o continha, mas em se tratando de bolo, no caso de fubá, ele sempre será de fubá não importa a forma que tiver, o princípio é o mesmo.
No entanto, se buscamos a forma em detrimento do princípio, sempre vamos tentar enfeitar mais aqui, melhorar um pouco ali, de modo que nunca vai sobrar tempo para trabalharmos a massa, porque na verdade acreditaremos que o que todo mundo quer mesmo, é passar o dedo na cobertura.
A cobertura é doce, pode até agradar no princípio, mas não tem consistência e com o tempo enjoa e adoece. A taxa de açucar sobe, e podemos ser acometidos de uma "diabete espiritual", se é que posso usar esse termo.
Logo, já está mais que na hora de tirarmos todo o glacê e começarmos a provar a massa. Já está na hora de abandonarmos a sacralidade do Templo-Igreja-Sinagoga e passarmos a encontrar a comunidade-ajuntamento-eclésia de Deus, a qual possui um único lugar sagrado, que é o altar erguido no coração humano.
É hora de abandonarmos nossas justiças próprias e nossos supostos direitos de julgamento sobre a alma do próximo, e nos entregarmos ao amor de Jesus, que nos ensina que a misericórdia é o único parâmetro de julgamento de seus discípulos, posto que além disso, todo ser humano há de cometer injustiça em algum momento, pois só Deus conhece o que se passa no coração de cada um.
Portanto misture pessoas, misericórdia, Palavra Viva de Deus, longanimidade e adoração. Tudo verdadeiramente, em nome de Jesus. Escolha sua forma e deixe que o Amor Infinito de Deus aqueça os corações, fazendo com que a massa cresça e se expanda.
Minha querida vózinha se foi, não sabia ler nem escrever, não podia deixar um registro escrito da receita de seu bolo, que havia aprendido da boca de sua mãe. Meus tios, tias e mãe, são de uma outra época, não tiveram paciência para aprender a guardar no coração e na mente uma receita tão boa. E eu, se na época tivesse a mentalidade de hoje, deveria ter me preocupado em aprender, ao invés de apenas saborear. Com certeza não teria o pesar de nunca poder mostrar para meus filhos o sabor daquele bolo.
Jesus também não deixou estatuto, dogmas ou bulas, mas ele deixou algo que não pode ser mensurado em plenitude de forma escrita ou estatística, como muitos fazem, até mesmo esse texto.
O sabor só é conhecido quando provado.
Não deixe a receita se perder.